TURISMO

Os perrengues das viagens à noite

Publicado na madrugada, por Miriã Arruda

Segunda-feira, 5h53. Chego em São Paulo num ônibus vindo de Curitiba. Não é a primeira vez, não chegando em casa pela manhã ou indo direto para o trabalho.

Viajar à noite tem suas vantagens, mas merece total disposição. Você não vai dormir bem, não vai ter hotel disponível pela manhã nem transporte fácil. Por sorte, um banho de torneira ou em algum banheiro público.

Desde pequena sou acostumada a pegar estrada com meus pais pela madrugada, principalmente as longas. Não tem trânsito, não tem sol esquentando o carro e ainda chega cedinho para o café da manhã e um dia todinho para passear. Sem fugir muito desse raciocínio, comecei a montar meus roteiros também dessa maneira. E ainda acrescento: uma diária a menos de hospedagem.

Em 2018, fiz minha primeira viagem internacional para a Tailândia. Foram hooooooras de voo. Escolhi o da madrugada, claro. Sai sexta-feira às 2h55 de Guarulhos e cheguei 16 horas depois, à 00h25 (horário do Catar) na conexão em Doha para a troca da aeronave. Ficaria mais de 19 horas na cidade e aproveitaria para conhecer melhor a cultura do país. Mas chegar de madrugada num lugar caro e machista dá um pouco de medo.

Antes de montar o roteiro, pesquisei sobre o aeroporto de Doha, um dos mais bem avaliados do mundo. Vi que tinha uma sala com poltronas reclináveis onde o silêncio era obrigatório e pensei: durmo lá e faço um tour pela manhã. Os homens ficavam em salas separadas das mulheres, o que foi ótimo para me sentir mais segura, mas não tinha tomada nem WiFi e eu precisava manter contato com os meus pais. Acabei dormindo numa poltrona desconfortável e em frente a uma TV ligada.

Sala de TV Aeroporto Doha. Foto: Reprodução/Viagem a bordo

A mala já havia sido despachada direto para o destino final (sempre pergunte antes de embarcar) e eu estava apenas com uma mochila de ataque, que possuía uma troca de roupa e itens de higiene. O passeio fora do aeroporto durou apenas quatro horas. As demais, fiquei andando pelo free shop, praça de alimentação, um banho de gato no banheiro e mais uma cochilada até meu próximo voo, às 20h15.

Foram mais 6h30 dormindo mal no avião, chegando em Chiang Mai – Tailândia ao amanhecer. Geralmente, os hotéis não liberam os quartos antes do check-in, que costuma ocorrer após às 14h, mas oferecem espaço para guardar as malas. O meu não era diferente. Cansada, mas animada por estar num lugar novo, deixei minhas coisas e fui para a cidade. Esse momento é bom para adiantar algumas coisas, como um city tour, câmbio ou até um café ou almoço. Dormi o restante do dia e confesso que o fuso horário de 10 horas e o cansaço da ida me deixaram acabada pelos próximos três dias. Mas faria de novo.

Barco noturno de Koh Phangan para Koh Phi Phi. Foto: Arquivo Pessoal

Ainda na Tailândia, precisava voltar da Full Moon Party, em Koh Phangan, para Koh Phi Phi em um tempo menor do que levaria retornando de ferry no dia seguinte. Entrei num barco noturno que nem me cabia em pé e voltei dormindo picado o quanto podia em uma das camas e colchões espalhados entre outras pessoas que jamais tinha visto, com direito a paradas para troca de barco e van.

Repeti tais feitos ainda voltando do Chile direto da balada para São Paulo, depois Uberlândia – MG e um ônibus para Caldas Novas – GO. Tudo para ganhar um dia com a família antes da virada de ano. Sozinha e de madrugada, dormi nos bancos do aeroporto aguardando meu embarque, um pouco mais nos dois voos e também no escurinho do ônibus.

Ônibus semi-leito de Lima para Huaraz, no Peru. Foto: Arquivo Pessoal/Miriã Arruda

No Peru, eu tinha poucos dias para aproveitar o país inteiro e o dinheiro estava bem contado. Montei um roteiro com todos os deslocamentos noturnos em ônibus, no mínimo semi-leito, economizado também nas diárias do hotel. E até que foi confortável, menos carregar o mochilão por aí o dia todo. Meu voo de volta a São Paulo ainda teve conexão na Colômbia. Ou seja, mais uma noite em bar e deitada no chão do aeroporto.

Mochilão mais mochila de ataque em tour por Lima. Foto: Arquivo Pessoal

É quase um ciclo sem fim: Floripa, Buenos Aires, Curitiba, entre outras viagens que eu não “dormi”. Às vezes, sacrificamos a qualidade do nosso sono por um dia a mais ou dinheiro no bolso. Mas você sobrevive. Se tiver milhas, ainda curte uma sala VIP.

Quer arriscar embarcar numa aventura noturna? Pesquise ainda no planejamento do seu roteiro para não prejudicar a sua viagem e esteja disposto a passar por alguns perrengues sempre com bom humor. Use roupas confortáveis, leve meias, um travesseirinho e uma manta, faça uma mala pequena e fácil de carregar com você, separe um lanche fácil e durma quando der. Aproveite todos os momentos do percurso para descansar. Vai valer a pena!

Única mala que levei para Curitiba. Foto: Renan Benevides
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