Publicado às 15h40
Folha de SP
O governador eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), quer transformar o combate à facção criminosa PCC como a marca de sua gestão e um trunfo para o seu plano de suceder Jair Bolsonaro (PSL) na Presidência da República, em 2023 ou 2027.
Doria deixou isso claro em reunião realizada nesta semana com futuros auxiliares.
Eles deverão elevar ao nível máximo o enfrentamento à facção criminosa, criada em 1993 num presídio de segurança máxima de Taubaté e que hoje possui ramificações em todos os estados do país.
Algumas frentes foram eleitas para esse combate, como sufocar o PCC financeiramente, atacando o seu diversificado sistema de lavagem de dinheiro, que inclui postos de gasolina, revendedoras de automóveis e empresas de exportação, entre outros empreendimentos comerciais.
Outro objetivo definido será tentar cortar totalmente o sistema de comunicação da quadrilha. Impedir que os chefões do PCC continuem a comandar o crime organizado de dentro do sistema. Para isso, a promessa é investir pesado em tecnologia.
A montagem da equipe que comandará as forças de segurança pública a partir do ano que vem também foi feita tendo como premissa o combate à facção criminosa.
Doria escolheu o general João Camilo Pires de Campos, com 48 anos de serviços no Exército, para comandar a Secretaria da Segurança Pública. Para a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária), indicou o coronel da reserva Nivaldo Restivo, ex-chefe da Rota, em substituição ao atual secretário do sistema penitenciário, Lourival Gomes.
À Folha, Restivo declarou que não deixará de tomar providências por temor de retaliação do crime organizado. “Isso não vai acontecer”, afirmou.
Na prática, é uma sinalização de que a gestão Doria está disposta a remanejar a cúpula do PCC, incluindo o chefe da facção, Marcola, de Presidente Venceslau para presídios federais, caso isso não seja feito até 1º de janeiro.
O pedido para transferir 15 chefes da quadrilha foi protocolado pelo Ministério Público Estadual e está sob análise da Justiça. Ele ocorreu depois da descoberta de um plano de resgaste dos criminosos no interior de São Paulo.
Na gestão Márcio França (PSB), houve divergência entre secretários sobre a pertinência de fazer a transferência neste momento devido ao risco de retaliações do PCC.
Futuro secretário da Administração Penitenciária, o coronel da reserva Restivo tem ótima relação com o atual (que permanecerá) comandante-geral da PM, Marcelo Viera Salles, e também com os delegados da Polícia Civil Youssef Abou Chahin (secretário-executivo) e Ruy Ferraz Fontes, futuro delegado-geral.
Isso facilita outro desejo de Doria: total integração entre a Secretaria da Segurança e a da Administração Penitenciária, em especial para a troca de informações dos seus serviços de inteligência.
Essa integração de setores de inteligência pode ser estendida, também, para um grupo a ser formado por membros da Polícia Militar, Polícia Civil, Exército, Ministério Público, do Judiciário e da Receita. Doria capitalizaria os frutos das ações em conjunto.
A intenção do tucano é dedicar parte de sua agenda para as ações da polícia, participando de entrevistas coletivas para imprensa e na divulgação in loco de operações de combate ao crime organizado, como fechamento de postos e vendedoras de veículo –diferentemente do que ocorria com Geraldo Alckmin (PSDB).
Doria avalia que um dos motivos que levaram o correligionário à derrota nas eleições presidenciais foi a falta de visibilidade das ações na área da segurança pública, setor onde considera ter havido bons resultados a serem propagados.
Um exemplo é a redução da taxa de homicídio, de 33,3 vítimas por 100 mil habitantes, em 2001, para 7,5, em 2017.
Também está nos planos do novo governador fazer uma remodelação na estrutura da Polícia Civil e Polícia Militar, ampliando a quantidade de grupos de elite no interior do estado, sobretudo da Rota (tropa de elite da PM) e do Deic (departamento que combate o crime organizado).
Ainda sobre a Polícia Civil, o futuro delegado-geral Ruy Ferraz Fontes deve promover uma restruturação, para priorizar casos de maior gravidade, aproximando-se de um modelo parecido com o da Polícia Federal.
A indicação de Fontes para o comando da Polícia Civil, considerado um dos principais especialistas do país sobre a estrutura do PCC, também foi uma sinalização de prioridade em ações contra o crime organizado.
Doria pretende ampliar ainda o número de vagas no sistema prisional, que atualmente possui um déficit de 90 mil vagas. A ideia do tucano é construir presídios por meio de PPPs (parcerias público privadas), missão que Restivo deve assumir a partir de janeiro de 2019.
Na campanha eleitoral, Doria chegou declarar que em sua gestão a polícia iria atirar para matar. Depois de ser aconselhado por auxiliares, modulou o discurso, passando a falar na ‘prisão de bandidos’.
O discurso de prioridade à segurança pública, porém, contrasta com o retrospecto de Doria na sua passagem pela prefeitura paulistana.
No comando da cidade, o tucano reduziu as despesas com a operação e manutenção da Guarda Civil Metropolitana, que caíram de cerca de R$ 23,5 milhões (2016) para R$ 18,3 milhões (2017).
Integrantes das forças de combate ao crime organizado dizem que Doria tem ignorado pontos fundamentais para esse enfrentamento. Não cita que há alta taxa de corrupção na Polícia Civil, que há a necessidade de recomposição salarial das polícias e que as leis de combate à lavagem de dinheiro precisam ser aprimoradas. Sem isso, acham que tudo pode acabar em pirotecnia.
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