REGIONAL

Laudos mostram que são remotas as atuais chances de Covas vender Anhembi

Tribunal de contas estipulou piso de R$ 1,45 bi, mas avaliações apontam valores de até R$ 927 mi

Publicado às 9h

Folha de SP

Laudos que integram o processo de privatização do Anhembi mostram que são remotas as chances de a gestão Bruno Covas (PSDB)vender o complexo pelo valor mínimo exigido pelo Tribunal de Contas do Município.

Na semana passada, o TCM autorizou o leilão da SPTuris, empresa oficial de turismo e eventos da cidade, que administra o Anhembi, mas estipulou um piso de R$ 1,45 bilhão. O leilão estava inicialmente marcado para junho.

O valor é 56,3% ou R$ 522 milhões maior do que a avaliação mais otimista obtida pela prefeitura sobre o Anhembi, trabalho realizado pela Companhia Paulista de Obras e Serviços (CPOS), empresa ligada ao governo paulista.

Em seu estudo, a CPOS classifica como “baixa” a atual condição de liquidez do Anhembi, considerando a situação da economia do país.

Outro fator levado em conta para essa conclusão é o porte do Anhembi. Apenas um seleto grupo de incorporadoras teria condições de entrar na disputa pela compra. Com o valor de mais R$ 522 milhões, a tendência é a de redução desse grupo já diminuto, ou mesmo a inexistência de incorporadoras dispostas a pagar somas de tamanha grandeza.

Inaugurado em 1970 por ocasião do Salão do Automóvel, o complexo do Anhembi tem 376,9 mil metros quadrados e é formado pelo Sambódromo, pelo Pavilhão de Exposições e pelo Palácio das Convenções.

O eventual futuro comprador não poderá derrubar o sambódromo e terá, por lei, de abrigar o Carnaval paulistano e outros eventos de interesse da cidade em até 75 dias por ano.

A avaliação de R$ 927,48 milhões feita pela CPOS, a mais alta obtida pela prefeitura, considera o valor de mercado do empreendimento com base em sua situação atual.

A companhia fez também uma avaliação por outro método, que considera o aproveitamento econômico do imóvel, dentro das bases legais, em um hipotético novo empreendimento como, por exemplo, um shopping center.

Esse método leva em conta as despesas de demolição e construção, taxas, previsão de receitas e até mesmo a futura margem de lucro, entre outros fatores.

Por esse método de avaliação, o valor estimado pela CPOS para o Anhembi cai para R$ 661,4 milhões, menos da metade do estipulado pelo tribunal de contas.

Uma segunda empresa de avaliação foi contratada pela prefeitura para estimar o valor do Anhembi.

A Brasil Plural Consultoria estabeleceu o valor em R$ 586 milhões pelo primeiro método e em R$ 681,3 milhões pelo segundo.

Todos os laudos técnicos apontaram valores de venda distantes dos cerca de R$ 4,5 bilhões que o governador eleito João Doria (PSDB) anunciava que seriam levantados com a privatização do espaço em sua passagem pela prefeitura.

Documentos anexados ao processo de privatização indicam também que o complexo do Anhembi tem abrigado cada vez menos eventos.

A razão seria justamente a falta de manutenção das instalações e de modernização dos equipamentos, situação agravada pelo aumento da concorrência no setor de eventos na cidade.

Se no ano de 2015 houve 43 eventos no Anhembi, em 2018 ocorreram apenas 9, com a consequente redução nas receitas da SPTuris.

No voto que baseou a decisão do colegiado do Tribunal de Contas do Município, o conselheiro Domingos Dissei afirmou que o Anhembi “é um dos mais valiosos e significativos ativos da cidade”.

Citou a localização privilegiada e argumentou que não há imóveis com as mesmas características na capital paulista. “É uma operação atrativa para o mercado”, afirmou, ao estabelecer o valor bem maior do que o previsto pelas empresas de consultoria.

“Tenho convicção de que é um valor justo, considerando o interesse público e a efetiva busca do resultado mais vantajoso para a administração”.

Seu parecer utilizou como alicerce um estudo do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de São Paulo, embora tenha acrescido R$ 50 milhões ao valor de R$ 1,4 bilhão estipulado pelo Creci-SP.

Nos próximos dias, a gestão Covas deve entrar com um recurso no TCM contestando o valor mínimo exigido com a alegação de que, na prática, inviabiliza o leilão do Anhembi.

Após um período de sucessivas decisões contrárias à administração tucana —especialmente durante a gestão de Doria, quando paralisou diversos processos—, o tribunal vinha de um período sem interferências significativas nos processos de concessão e de privatização da prefeitura.

Recentemente, no entanto, o tribunal tomou seguidas decisões contrárias à prefeitura, com as suspensões do leilão do Anhembi e da concessão do sistema de estacionamento rotativo (Zona Azul).

As medidas aborreceram a gestão municipal. À época, o secretário de Governo Mauro Ricardo declarou à Folha que os “lobbies” haviam vencido.

Para Marco Antonio Teixeira, professor de administração pública da FGV, o tribunal de contas municipal precisa dialogar mais com a gestão da cidade.

“Existe um histórico de interferência do TCM que é anterior a essa gestão, inclusive. A relação não deveria ser tumultuada assim. O TCM é órgão de controle, mas não tem que apontar apenas o que está certo e o que está errado. Tem que ajudar a desembaralhar os problemas de gestão”, afirma o professor.

Segundo ele, o ideal seria as partes discutirem e entrarem em um acordo sobre quem está errado sobre o valor mínimo do leilão.

“Ninguém sabe qual será o fim do processo se a prefeitura decidir recorrer à Justiça para arbitrar a questão. O impasse joga a decisão para sabe-se lá quando. E isso é ruim para a prefeitura, que quer privatizar, e para o TCM, que continua sendo visto como obstáculo”, conclui.

 

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