Publicado às 10h15
Jornal Agora
O novo modelo pedagógico para a rede estadual de educação de São Paulo, apresentado pelo governador João Doria (PSDB) no último dia 6, ainda não é consenso entre alunos, professores e educadores.
O programa Inova Educação pretende levar parte da experiência das escolas de período integral do estado a toda a rede a partir de 2020. Isso vai acontecer com a diminuição de cinco minutos de cada aula e ampliação de 15 minutos do dia letivo. Com isso, estudantes terão sete aulas diárias de 45 minutos cada, ao invés de seis de 50 minutos, como é hoje.
As escolas regulares vão oferecer duas aulas por semana de “projeto de vida”, dois componentes eletivos, escolhidos pelos alunos, e uma aula de tecnologia.
“Na escola integral, um dos principais diferenciais é a existência dessas disciplinas. As eletivas buscam desenvolver os interesses e aptidões dos estudantes, definidos por eles próprios em seus projetos de vida, trabalhando sempre de forma interdisciplinar as competências definidas na BNCC [Base Nacional Comum Curricular]”, diz Fátima Rizzo, diretora da Escola Estadual Alexandre Von Humboldt, na Lapa (zona oeste), uma das primeiras a oferecer ensino integral.
Para a psicopedagoga e professora da Faculdade de Educação da PUC-SP Neide Noffs, porém, será difícil replicar o modelo nas escolas regulares. “Está sendo feito de forma apressada e sem conscientização. É apenas uma ideia lançada, sem consistência”, afirma.
Uma professora de escola integral concorda. “Na implementação, contamos com amplo apoio e supervisão da secretaria e da coordenadoria de ensino”, afirma. “Mesmo assim, acho que vai haver uma dificuldade enorme.”
Segundo a Secretaria de Educação, a proposta pedagógica da disciplina de tecnologia vai depender do nível de maturidade dos recursos tecnológicos de cada escola. Há ainda um investimento previsto de R$ 129 milhões para equipar laboratórios e construir materiais de apoio para a rede.
A formação dos professores preocupa. A Secretaria de Educação diz que os profissionais interessados em ministrar as novas disciplinas deverão passar por um curso de 60 horas, e que receberão material de apoio.
Melhora
A Escola Estadual Alexandre Von Humboldt foi uma das primeiras a oferecer ensino em período integral em SP. “Fizemos parte do projeto-piloto, em 2012, que serviu de base para a ampliação do conceito”, diz Fátima Rizzo, diretora da unidade.
O modelo teve êxito rápido. O colégio passou de 1,94 no Idesp (índice que avalia a qualidade do ensino), em 2011, para 3,41 no ano seguinte. No ano passado, o indicador chegou a 4,66.
O projeto ensina aos alunos, por meio de dinâmicas, temas como a administração do próprio tempo, o compromisso com a comunidade e, principalmente a desenvolverem perspectivas para o futuro e trabalharem aspirações.
“É um método que estimula o protagonismo do aluno”, explica a coordenadora Célia de Jesus.
Na aula de iniciação científica, o grupo de Yuri Lisboa, 15 anos, e Thiago Barbosa, 16, trabalha atualmente no projeto de uma prótese de perna equina mais eficiente que as existentes no mercado. Segundo Yuri, o grupo chegou ao tema a partir das aulas de projeto de vida.
“Eu tenho interesse em cursar veterinária, então pesquiso a anatomia dos cavalos. Um colega quer fazer mecatrônica e estuda a parte elétrica. Um outro, que pensa em cursar psicologia, fica com a reabilitação e fisioterapia do animal”.
Ex-alunos
Ex-alunos da Escola Estadual Alexandre Von Humboldt ouvidos pela reportagem reconhecem a importância de aulas extras, como as de projeto de vida, mas ficam em dúvida quanto à viabilidade de implementação de modelo semelhante em toda a rede de ensino regular.
“Por serem matérias que dependem muito do envolvimento de cada aluno, muita gente não tira proveito”, diz Luiz Felipe Ferreira, 23 anos, hoje no último ano de administração pública na USP (Universidade de São Paulo). “Acho que muitos alunos e professores não vão ter essa receptividade”, afirma.
A opinião é a de mesma por Piero Capo de Rosa, 19. “Existe muito a visão de que, se não é prático, não é útil. Por serem disciplinas que buscam o autoconhecimento, muita gente não levava a sério e usava o tempo das aulas pra outras coisas”, afirma o estudante de ciência e tecnologia da UFABC (Universidade Federal do ABC).
Suporte
O coordenador pedagógico da Secretaria de Educação, Caetano Siqueira, afirma que a pasta possui indicadores qualitativos que indicam resultados positivos das disciplinas no ensino integral.
“A gente aprendeu muito de 2012 para cá. Com a experiência com mais de 190 mil alunos nas escolas integrais, temos material farto para implementar as novas disciplinas no ensino regular”, afirma.
Siqueira considera o Inova Educação como um “próximo passo” em direção ao ensino integral em todas as escolas da rede. “Vamos usar a experiência que temos para dar suporte a todas as escolas que vão incorporar esses componentes curriculares.”
Nessa nova fase, segundo Siqueira, os professores receberão um “cardápio” de disciplinas eletivas que tiveram sucesso em outras escolas, mas também terão autonomia para propor disciplinas de acordo com as necessidades e aspirações dos alunos.
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