SAÚDE

Projeto que permite cesárea sem indicação no SUS é aprovado em SP

Publicado às 9h45

Folha de SP

A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou nesta quarta (14) um projeto de lei que garante à gestante a opção pela cesárea no SUS, na hora do parto e sem indicação clínica, a partir da 39ª semana de gestação.

De autoria da deputada Janaína Paschoal (PSL), o projeto teve 58 votos a favor e 20 contrários. A proposta seguirá para sanção ou veto do governador João Doria (PSDB).

O deputado estadual Campos Machado (PTB) disse que recorrerá ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para tentar derrubar o projeto. Para ele, a proposta é um “incentivo desenfreado e irresponsável às cesáreas”.

Já o Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) defende o projeto de Paschoal, alegando que se opõe à “vilanização” dos partos cesarianos.

Diz que há eventos adversos decorrentes da demora em se realizar cesariana e por complicações da insistência pelos partos vaginais.

O Brasil é o segundo país com maior taxa de cesáreas no mundo, só perdendo para a República Dominicana (56%). Dos partos feitos no SUS, 40% ocorrem por meio de cirurgias. Na rede privada, o índice chega a 84%.

Para Simone Diniz, médica e professora da Faculdade de Saúde Pública da USP, a aprovação do projeto de Paschoal vai na contramão de todas as evidências científicas mundiais existentes sobre segurança de mães e bebês.

Mas, na sua opinião, todo o apoio que a proposta recebeu reflete a falta de acesso de mulheres brasileiras a um parto mais respeitoso.

“Para muitas mulheres, ou se tem parto normal com uma assistência obstétrica agressiva ou a cesariana. Nesse contexto, a opção cirúrgica parece mais segura do ponto de vista físico e emocional.”

Segundo Diniz, sem mudar a agressividade do manejo do parto, a cesárea vai continuar sendo uma opção atraente.

“O país só vai superar isso quando chegarmos ao nível dos países desenvolvidos, com as enfermeiras obstetrizes fazendo os partos de baixo risco, deixando para os médicos aqueles com complicações clínicas e obstétricas.”

A violência obstétrica sofrida pelas gestantes no SUS é o principal argumento usado pela deputada na defesa do projeto.

“O que está ocorrendo com as mulheres mais pobres neste país é inadmissível. Com 40 semanas de gestação, os bebês estão prontos para nascer. Mandam mulheres nessas condições voltarem para suas casas, uma série de vezes de ônibus, esperando a hora de o bebê nascer”, afirma.

Ela diz que, por conta da demora e da insistência no parto normal, os bebês sofrem “anóxia [falta de oxigênio], ficando sequelados para o resto da vida, em virtude da chamada paralisia cerebral”.

Não há dados sobre as taxas de paralisia cerebral no estado de São Paulo ou estudos que determinem se essa ocorrência é maior ou menor em hospitais públicos ou privados paulistas, segundo a Sogesp.

“Não há evidência na literatura médica de que o parto normal esteja associado a um maior risco de paralisia cerebral. Ao contrário, há dados que comprovam que o aumento nas taxas de cesariana não muda a ocorrência de paralisia cerebral”, diz a ginecologista e professora da USP Rossana Pulcineli Vieira Francisco, presidente da entidade.

Vários estudos apontam que somente 10% dos casos de paralisia cerebral estão relacionados a eventos durante o parto. Os demais (90%) têm causas genéticas ou estão associados a alterações durante o pré-natal ou após o nascimento do bebê.

“Sem dados concretos, tomar decisões, projeto de lei sobre um evento extremamente grave, mas pouco frequente e de causa multifatorial é muito temeroso e de certa forma irresponsável com a saúde pública”, afirma.

Para ela, uma das prováveis consequências do projeto, caso sancionado por Doria, será o aumento indiscriminado nas taxas de cesárea nos hospitais públicos paulistas.

“Esse fato também não foi analisado de forma adequada, inclusive com planejamento sobre seu impacto em relação às complicações da cesariana como maior risco de hemorragia e infecção.”

Segundo Rossana Francisco, o aumento de cesarianas está associado a complicações obstétricas que levam a hemorragias, que são hoje uma das principais causas de mortalidade materna no país.

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