Publicado às 9h30
Por Nabil Bonduki / Folha de SP
Tornar o trânsito mais seguro, reduzindo os índices de acidentes, é um dos grandes desafios da mobilidade no Brasil. Mas não será facilitando a vida dos motoristas, como propõe Bolsonaro, que vamos atingir esse objetivo.
O Código Nacional de Trânsito, que instituiu pontos para a suspensão da carteira, e a Lei Seca reduziram significativamente as mortes no trânsito. Mas o índice ainda é alto: 23 mortes para cada 100 mil habitantes. O país ocupa o 5º lugar em números absolutos de mortes e tem o 65º pior índice, em termos absolutos, no mundo. Fora da África, há poucos em pior situação.
Em 2016, foram registrados 37.345 óbitos, segundo o Ministério da Saúde, com queda de 14,8% em relação a 2014. Nos últimos 12 anos, o trânsito matou cerca de 500 mil brasileiros e feriu 1,5 milhão. Os acidentes custaram R$ 3 bilhões ao SUS em dez anos.
Medidas estruturais são necessárias para dar um novo salto na segurança. Mas as alterações propostas, que atendem a promessas populistas de campanha, vão no sentido contrário. É consenso entre os especialistas que agravarão o problema. Felizmente, a maioria dos brasileiros pensa da mesma forma.
O Datafolha mostra baixo apoio às medidas: 56% são contra dobrar o número de pontos (de 20 para 40) antes da suspensão do direito de dirigir; 68% são contra o fim da multa para levar crianças fora da cadeirinha, no banco de trás do veículos; 67% são contra acabar com os radares que fiscalizam o excesso de velocidade nas estradas federais.
Em síntese, 41% dos brasileiros considera que as medidas farão o trânsito mais violento.
O uso de cadeirinhas infantis reduz em até 60% as crianças mortas em acidentes, segundo a Organização Mundial da Saúde. A ONG Criança Segura revela que, entre 2001 e 2017, cerca de 5.000 crianças de até nove anos morreram em acidentes, sendo a falta de cadeirinha a principal causa. Lesões no trânsito são a principal causa de morte de crianças e jovens de 5 a 29 anos.
Em relação aos radares de velocidade, a Folha mostrou que os trechos de rodovias federais que receberam o equipamento tiveram uma média de redução nas mortes e nos acidentes de, respectivamente, 22% e 15%. O risco de morte para pedestres atingidos por automóveis aumenta 4,5 vezes quando a velocidade sobe de 50 km/h para 65 km/h.
São dados acachapantes, mas não convence a todos: 1 em cada 3 pessoas concordam com a extinção dos radares e eliminação da multa para quem não usa cadeirinha, enquanto 44% apoiam o aumento no limite de pontos. E 56% não concordam que as medidas tornarão o trânsito mais violento!
Esses números estão próximo aos que consideram o governo Bolsonaro ótimo e bom, expressando uma parcela da sociedade que despreza o que se convencionou chamar de “politicamente correto”.
Mudanças são necessárias, mas exigem um debate aprofundado e baseado em estudos técnicos. O principal foco deveria estar voltado para as motocicletas, cujo índice de acidentes tem se elevado sem medidas efetivas.
Em relação à pontuação, poderia ser estudada a redução do número de pontos das infrações leves (3 ou 4 pontos), que não geram risco à vida, ao mesmo tempo em que deve se aumentar a pontuação das graves (7 pontos), que podem provocar acidentes fatais.
O enfrentamento do problema exige mudança cultural. A educação para o trânsito é essencial e deveria focar homens jovens. Cerca de 73% de todas as mortes no trânsito são de jovens do sexo masculino.
Não por acaso, os homens apoiam mais as medidas de Bolsonaro que as mulheres.
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