Publicado às 10h30
Folha de SP
Fiscalização frágil e até corporativismo, segundo especialistas, são ingredientes que colocam prédios no Brasil sob risco de incêndios devastadores, como o que atingiu o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, na noite do domingo (2).
Para aumentar a prevenção contra incêndios, há quem peça maiores poderes aos bombeiros e quem reclame da falta de padrões nacionais ao exigir itens mínimos de segurança em edificações.
No país, cabe aos municípios autorizar a ocupação de imóveis como escolas, hospitais, hotéis e escritórios. Assim, as prefeituras podem exigir regras de segurança de prevenção a incêndios.
De maneira geral, por falta de recursos, as administrações municipais têm pouca estrutura para fiscalizar a aplicação dessas regras. Mas, por meio de convênios, elas podem transferir para o Corpo de Bombeiros dos estados a cobrança de itens de segurança nos imóveis novos.
É o que acontece, por exemplo, nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, em que as prefeituras exigem um auto de vistoria dos bombeiros para liberar o uso de uma nova construção. No caso do Rio, os bombeiros respondem atualmente ao Gabinete de Intervenção Federal, que gere a segurança pública do estado desde fevereiro.
Mas, onde não há este tipo de acordo com os bombeiros, a fiscalização é frágil, segundo o engenheiro Antonio Fernando Berto, chefe do Laboratório de Segurança ao Fogo e a Explosões do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), de São Paulo.
Por isso, Berto defende concessão de maiores poderes aos bombeiros de todo o país, para que, ao identificarem o risco na ocupação de um imóvel, possam ter a atribuição de interditá-lo. Essa não é uma prerrogativa dos bombeiros em todos os estados. Uma frente parlamentar no Congresso estuda a padronização de procedimentos nacionalmente.
Para o coronel da reserva e oficial dos Bombeiros paulista Sergio Athayde, o poder de interditar e conferir multas a imóveis inseguros teria efeito limitado no país. Isso porque, segundo ele, há uma dificuldade do Estado brasileiro em fiscalizar seu próprio patrimônio.
Há corporativismo e disputas administrativas que emperram tomadas de decisões mais contundentes, diz Athayde. “Pode se interditar shopping, clube, mas não interdita uma escola pública que não tenha o mínimo de acessibilidade ou rota de fuga”. Ele sugere que o Ministério Público seja mais atuante na cobrança de condições mínimas de segurança em espaços públicos.
Um exemplo desse gargalo é o Museu da Língua Portuguesa, consumido por um incêndio em 2015, em São Paulo. Na ocasião, o local não tinha vistoria dos bombeiros que atestasse sua segurança.
O próprio Museu Nacional não tinha o laudo atualizado de vistoria dos bombeiros à época de uma fiscalização do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União, feita em 2014.
À época, o museu se justificou dizendo que, por ser tombado pelo patrimônio histórico, não conseguiria atender às exigências dos bombeiros.
Segundo Athayde, o fato de imóveis serem tombados não os impede de serem adaptados e se tornarem mais seguros contra incêndios.
“Podem-se adicionar cortinas ou tintas que sejam retardantes ao avanço do fogo, ou adicionar outros equipamentos de detecção e de combate a incêndio. Mas no caso do Museu Nacional, não se cuidou nem dos cupins [em 2017, uma infestação de cupins danificou a base de um esqueleto de dinossauro no museu carioca]”.
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