Publicado às 10h10
Folha de SP
Cerca de 2,1 milhões de jovens com idades entre 15 e 29 anos que vivem na cidade de São Paulo não foram imunizados contra o sarampo durante a infância. A faixa etária corresponde à metade dos 363 casos confirmados da doença na capital.
De acordo com Solange Saboia, coordenadora da Covisa (Coordenadoria de Vigilância em Saúde), 75% dos jovens que nasceram entre os anos 1990 e 2004 não receberam a segunda dose da vacina tríplice viral, que protege contra sarampo, caxumba e rubéola e deve ser aplicada a partir dos 15 meses de idade.
Estimada em 2,9 milhões, essa população é o público-alvo da campanha de vacinação desde o dia 10 de julho, após a Prefeitura de São Paulo registrar aumento no número de pessoas com sarampo.
Na época em que esses jovens deveriam ter recebido o reforço na imunização, ainda na infância, o Brasil havia superado a pior epidemia de sarampo, em 1986, quando a incidência da doença chegou a 97,7 por 100.000 habitantes.
No final da década de 1990, devido a campanhas de vacinação em todo país, esse número baixou para 42 infectados por 100 mil habitantes.
O país não registrava novos casos de sarampo contraídos em território nacional desde 2000. Desde então, todos os casos confirmados haviam sido importados, quando o paciente é infectado em outro país e desenvolve a doença ao voltar para casa.
A circulação do vírus voltou a ocorrer no Brasil em fevereiro de 2018, quando foram registrados mais de 10 mil casos em 11 estados, sendo a maior incidência na região norte, no Amazonas e em Roraima.
Neste ano, o vírus começou a circular na cidade de São Paulo a partir de fevereiro, trazido por pessoas que estiveram em países como Noruega, Malta e Israel. A região central da capital foi o epicentro da disseminação, segundo a coordenadora da Covisa.
Diante disso, agentes de saúde têm montado postos avançados de vacinação em condomínios onde vivem pessoas que tiveram a confirmação de infecção pelo vírus.
Em um desses endereços, na rua Frei Caneca, na região central de São Paulo, moradores formaram fila no hall de entrada do prédio para receber a dose durante toda a manhã desta quarta-feira (24).
Essas ações, chamadas de bloqueios vacinais, são feitas para ampliar o número de indivíduos imunizados no entorno até 72 horas após a confirmação do caso para evitar a propagação do vírus.
Desde fevereiro, foram montados cerca de 1.200 bloqueios vacinais em toda cidade.
Segundo pesquisa da secretaria de Saúde, entre os motivos alegados pelos pais para não terem dado a segunda dose de vacina aos filhos, que hoje têm entre 15 e 29 anos, estão falta de tempo e medo de reações e efeitos colaterais.
“É uma tendência mundial. Com a eliminação da doença, as pessoas não veem outras infectadas, se esquecem de vacinar as crianças e tendem a achar que a doença está eliminada”, diz Solange.
Diante disso, servidores municipais têm ido a creches e escolas infantis para aplicar a vacina tríplice viral em crianças de até 1 ano, quando a primeira dose deve ser ministrada.
“Enfrentamos resistência dos pais devido a notícias falsas como a de que a vacina do sarampo provoca autismo“, diz a coordenadora da Covisa.
A volta do sarampo após a erradicação da doença é um fenômeno global ao menos desde 2017, quando a OMS (Organização Mundial de Saúde) identificou surtos do vírus em 170 países. Neste ano, o número de pessoas infectadas teve aumento de 300% em todo mundo na comparação com 2018.
Devido ao alto poder de contágio do vírus, uma pessoa infectada pode passar a doenç a para outras 18, de acordo com a secretaria de Saúde.
Para atingir a meta de imunizar 95% das pessoas de 15 a 29 anos que vivem na capital, agentes de saúde têm se concentrado em lugares de grande circulação, como shopping centers e estações de metrô. A campanha de vacinação vai até 16 de agosto.
A partir da primeira semana do mês que vem, quando chegam ao fim as férias escolares, as equipes de vacinação irão se concentrar em universidades públicas e particulares.
De acordo com a médica Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, é difícil convencer adultos a se vacinar, o que contribuiu para a volta da circulação do sarampo. “Existe uma resistência maior, principalmente entre os homens, que não têm a cultura da prevenção”, diz ela, que também cita a rotina atribulada de trabalho como um empecilho.
Além disso, a médica aponta a falta de informação como um dos principais componentes que mantêm os adultos longe dos postos de vacinação. “Ainda há pessoas que acreditam que vacina é só para crianças”, diz.
“Há também muita dúvida se o adulto tomou ou não as doses enquanto criança. Como estamos diante de uma urgência, o recomendado é que todos tomem as duas doses.”
11 DÚVIDAS SOBRE O SARAMPO
O que é sarampo? É uma doença infecciosa aguda transmitida por um vírus do gênero Morbillivirus, da família Paramyxoviridae, caracterizada por manchas na pele. É grave, estava erradicada no Brasil e voltou porque as pessoas deixaram de se vacinar.
Como é transmitido? A transmissão acontece pela saliva, carregada pelo ar (quando a pessoa tosse, fala ou espirra). Ou seja, é altamente contagiosa.
Quais os sintomas? Febre alta (acima de 38,5°C), manchas vermelhas na cabeça e no corpo, tosse, dor de cabeça, coriza e conjuntivite. As manchas vermelhas costumam ser precedidas por manchas brancas na mucosa bucal.
Sarampo pode matar? Sim. É uma doença que traz complicações graves, inclusive neurológicas, e pode levar à morte, sobretudo de crianças pequenas. Também pode deixar sequelas como a surdez.
Como é o tratamento? O doente é isolado e apenas os sintomas são tratados — as manchas, febre e dores. Por isso a vacinação é a ferramenta mais eficaz no combate à doença.
O que fazer em caso de suspeita? Encaminhar o paciente a um serviço de saúde, que por sua vez notificará a vigilância epidemiológica para que esta vacine quem teve contato com o doente.
Quem deve se vacinar contra o sarampo? Crianças e jovens de até 29 anos precisam ter tomado duas doses da vacina —quem tem de 30 a 59, apenas uma dose. A maioria das pessoas com mais de 60 anos não precisa da vacina, pois já teve contato com o vírus no passado. Na dúvida sobre ter ou não tomado a vacina na infância, é melhor tomá-la agora. Não é preciso levar a carteirinha de vacinação.
Onde é feita a vacinação? Em postos de saúde e, durante a campanha, em pontos anunciados pelo governo, como estações do metrô. É preciso levar caderneta de vacinação, cartão do SUS e documento com foto (a carteira e o cartão podem ser feitos ou refeitos nos postos).
Quais as reações à vacina? Febre e dor no local da injeção, com possível inchaço. Não há reações neurológicas. A vacina NÃO causa autismo.
Quem não pode se vacinar? Gestantes, bebês menores de um ano, transplantados, quem faz quimioterapia e radioterapia, ou usa corticoides ou tem HIV com CD4 menor que 200. Alérgicos a ovo e lactantes podem tomar a vacina.
Por quanto tempo a vacina vale? Para quem completou as duas doses (ou uma dose até 1989), vale pela vida toda. A vacina também protege contra rubéola e caxumba.
Adicione Comentário